Entre os dias 7 e 16 de fevereiro foi celebrada a 60ª sessão da Comissão das Nações Unidas para o Desenvolvimento Social. Na ocasião, o movimento cooperativista foi representado pelo presidente da Associação Cooperativa Internacional (ACI), Ariel Guarco. Nesse contexto, ganhou destaque também o Relatório 2021 Cooperativas e Desenvolvimento Social, firmado pelo secretário-geral da ONU, António Guterres.
Vale esclarecer que a Comissão da ONU para o Desenvolvimento Social foi estabelecida em 1946 (originalmente com o nome de Comissão Social) e, ao longo desses 76 anos, tem contribuído para a promoção da justiça social, da inclusão e da dignidade dos mais vulneráveis, por meio da disponibilização de um espaço nas Nações Unidas para pessoas de todo o mundo discutirem questões emergentes relacionadas ao bem-estar de todos.
No caso específico da 60ª sessão desse comitê, realizada em fevereiro, o fim da pobreza e da fome (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 1 e 2) foram os temas de destaque, tendo em vista que faltam menos de 10 anos para o cumprimento da Agenda 2030 e a pandemia de Covid-19 teve grande impacto sobre essas questões.
Nesse sentido, o secretário-geral da ONU já menciona em seu Relatório Cooperativas e Desenvolvimento Social que “alguns dados disponíveis já ilustram a importância das cooperativas para a criação de trabalho decente, a redução da pobreza, a mobilização de recursos para investimentos e a proteção do meio ambiente”.
De fato, segundo esse mesmo documento, “as empresas cooperativas são importantes impulsionadoras do desenvolvimento sustentável”.
Reconhecendo esse importante papel das cooperativas, o presidente da ACI, Ariel Guarco, durante sua apresentação na 60ª sessão da citada Comissão, afirmou: “Estamos convencidos de que não conseguiremos reverter a pobreza e a fome se não adotarmos um paradigma cooperativo que garanta o crescimento econômico com trabalho decente, igualdade de gênero e cuidados com os ecossistemas, entre outras condições”.
Diante de tais observações, é válido aprofundarnos um pouco mais na relação entre cooperativas e desenvolvimento social, tomando como base, sobretudo, os apontamentos feitos pelo secretário-geral da ONU, António Guterres. Acompanhe:
No primeiro capítulo do Relatório Cooperativas e Desenvolvimento Social, o secretário-geral das Nações Unidas aborda alguns exemplos de ações cooperativas visando contribuir com o enfrentamento dos efeitos da pandemia de Covid-19.
Segundo ele, durante esse período, as instituições cooperativistas colaboraram no apoio econômico, jurídico e de saúde de trabalhadores, empresas e comunidades; proporcionaram o acesso a itens de necessidade básica; desenvolveram campanhas de conscientização, entre outras iniciativas de relevo.
No documento mencionado, Guterres reforça, por exemplo, que “a pandemia de Covid-19 provocou um aumento repentino e massivo da demanda por serviços de saúde e as cooperativas de saúde em muitos países estavam preparadas para prestar apoio, aliviando algumas das pressões enfrentadas pelos sistemas públicos de saúde”.
Nesse contexto, o secretário-geral ainda destaca o fato de que, no Brasil, “os serviços de saúde cooperativos cobrem 85% do território nacional, o que representa 32% do mercado privado de atenção à saúde”.
Além disso, na opinião do representante da ONU, “ainda que a crise social e econômica desencadeada pela Covid-19 não tenha precedentes em muitos sentidos, as cooperativas podem ser uma poderosa ferramenta para um enfoque centrado nas pessoas visando uma recuperação mais inclusiva, resiliente e socialmente justa”.
De todo modo, para que isso realmente ocorra, “um marco jurídico e regulatório coerente, sólido e de apoio é um fator chave para o êxito das cooperativas. Isso requer que os encarregados de formular políticas e os legisladores assegurem-se de que as características especiais do modelo empresarial cooperativo estejam integradas nesse marco”. Saiba mais a seguir.
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De acordo com o Relatório Cooperativas e Desenvolvimento Social, “a ausência de marcos jurídicos de apoio para as cooperativas ou a presença de marcos jurídicos inadequados pode impactar negativamente as cooperativas e sua evolução. O contrário também é correto, sendo que a presença de regulações de apoio pode melhorar o desenvolvimento cooperativo, atuando como um importante impulsor do desenvolvimento sustentável e, por extensão, uma recuperação justa da pandemia de Covid-19”.
O documento ainda aponta que “dos países que se estudaram nas Américas, a maioria tem uma lei geral que regula todas as cooperativas. Alguns países têm, além dessa lei geral, uma ou mais leis especiais dedicadas a certos tipos de cooperativas, em particular, as cooperativas de crédito e as cooperativas de trabalho (por exemplo, o Brasil)”.
De fato, em nosso país, as cooperativas são regidas pela Lei 5.764, de 16 de dezembro de 1971, conhecida como Lei Geral do Cooperativismo. As cooperativas financeiras, por sua vez, contam com a LC 130/2009. E as cooperativas de trabalho, com a Lei 12.690/2012.
Cabe observar, por outra parte, que ditas leis, ao longo do tempo, têm sido alvos de questionamentos, polêmicas e também de necessárias revisões. A modernização da Lei das Cooperativas Financeiras, por exemplo, é considerada fundamental por diversos representantes nacionais, como o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Nesse sentido, o mencionado Relatório aponta que “a necessidade de atualizar a legislação cooperativa identifica-se em muitos países e regiões, particularmente, nas Américas e na África, onde vários marcos jurídicos não foram reformados durante muitos anos”.
Além disso, o documento ainda faz referência a diversos desafios persistentes nesse contexto. Cabe mencionar, por exemplo, que “a lei tributária nem sempre dá conta da natureza e do funcionamento específicos das cooperativas nem reconhece seu propósito mútuo. Em muitos casos, as cooperativas estão sujeitas principalmente a um regime fiscal geral que também é aplicável a outras formas de negócio”.
Em relação a este tema específico, vale reforçar que, no Brasil, segue em vigor a mobilização pelo Ato Cooperativo na Reforma Tributária, evitando que as cooperativas sejam alvo de dupla incidência de impostos.
Tendo em vista o importante papel das cooperativas no desenvolvimento social, o mencionado Relatório da ONU ainda incentiva o fortalecimento dessas instituições, sobretudo por meio da educação cooperativista, do apoio técnico e financeiro ao setor e da recopilação de dados sobre o movimento.
De acordo com o documento, “o desenvolvimento da educação universitária sobre cooperativas (e o Direito cooperativo) melhorará a compreensão social das cooperativas e garantirá um tratamento jurídico mais adequado”.
“O apoio técnico e financeiro através de associações com instituições internacionais e governos é uma forma importante de fortalecer o movimento cooperativista e o desenvolvimento cooperativo internacional e as organizações representativas”, afirma também o Relatório firmado pelo secretário-geral Guterres.
Além disso, “uma informação mais precisa sobre as cooperativas mediante a recopilação de dados estatísticos também pode respaldar a legislação cooperativa, já que através de dados precisos se pode quantificar a contribuição total das cooperativas ao desenvolvimento sustentável”.
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Conforme o Relatório Cooperativas e Desenvolvimento Social, “para reconstruir para melhorar e lograr a Agenda 2030 e seus Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, se requer um novo contrato social na era pós-Covid-19. O novo contrato social envolve governos, pessoas, sociedade civil, empresas e outras partes interessadas para construir uma sociedade mais inclusiva, equitativa, resiliente e sustentável com proteção social para todos. As cooperativas têm um papel importante a desempenhar no contexto desse novo contrato social, já que pôem as pessoas, mais que os rendimentos, no centro de suas operações”.
Nesse sentido, o documento aborda ainda algumas recomendações para promover ainda mais o modelo de empresa cooperativa e, assim, recuperar-se melhor da pandemia de Covid-19.
Confira alguns destaques:
a) Os governos deveriam criar políticas e programas para aproveitar o modelo de empresa cooperativa com o fim de lograr uma recuperação mais inclusiva e resiliente mediante a ampliação da prestação de serviços cooperativos.
b) Os governos nacionais deveriam seguir melhorando os marcos legislativos e regulatórios, em consonância com o projeto de diretrizes encaminhadas a criar um entorno propício para o desenvolvimento das cooperativas.
c) Os governos deveriam seguir fortalecendo suas capacidades para recopilar dados completos e internacionalmente comparáveis sobre o papel das empresas cooperativas no desenvolvimento social e econômico, e na implementação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
d) Os governos e os associados deveriam seguir aumentando o intercâmbio de melhores práticas para acrescentar ainda mais consciência pública sobre a forma cooperativa de empresa.
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